Oficialmente, a escravidão foi abolida no Brasil pela Lei Áurea em 13 de maio de 1888. Porém, 220 anos depois, vivemos um outro tipo de escravidão: a escravidão digital. A escravidão digital não é oficial, mas é psicológica. As pessoas sentem medo de perder o crédito em seus serviços caso não consigam responder a um e-mail no final de semana, em um feriado, ou até nas férias.
Um amigo recentemente se deparou com o seguinte problema: recebeu, em uma bela manhã, um e-mail dizendo que há três dias um outro funcionário aguardava uma resposta dele, e que, por isso, o projeto estava parado. Detalhe: esse e-mail foi recebido segunda-feira pela manhã, e o primeiro e-mail com a pergunta foi disparado sexta-feira às 20h, após o expediente.
As pessoas estão cada vez mais impacientes com o tempo de resposta. Disparam um e-mail com uma dúvida e, depois de 10 minutos, já vem um segundo e-mail perguntando por que você não respondeu o primeiro!
Se você se programa para viajar no final de semana, o seu chefe logo lhe pergunta: “Você vai estar com o celular? Tem Internet aonde você vai? Você vai levar seu notebook?”.
Se não bastasse tudo isso, já existem serviços que mostram em um mapa a sua localização rastreando seu celular. Não é um serviço totalmente preciso, pois não é um GPS. Porém, é precisão suficiente para saberem o bairro em que se encontra e se pode se deslocar para a empresa para resolver um problema urgente.
Os smartphones agravaram o problema, porque agora você não pode nem mais dar a desculpa de que não levou o notebook ou que não havia micro no local aonde você foi. Afinal, você pode baixar seus e-mails em seu celular.
Algumas pessoas estão viciadas nestas ferramentas e não conseguem ficar sem consultar o e-mail em seu smartphone. Levam-no para a praia, para a casa de campo, para o clube, enfim, para onde forem.
Em seus quadros mais graves, algumas pessoas ficam irriquietas, suam frio, sentem-se inseguras pelo fato de não estarem conectadas e não conseguirem ver o e-mail. Alguns hotéis já obrigam seus hóspedes a deixar seu celular na recepção e alguns resorts, inclusive, instalaram bloqueadores de celulares, para evitar que as pessoas entrem com seus aparelhos escondidos!
O barateamento dos notebooks e dos roteadores wireless está contribuindo para proliferar as redes domésticas sem-fio. Um amigo relatou que teve uma surpresa ao entrar em seu quarto, porque havia uma placa de “Proibido Notebook”. Era uma brincadeira de sua esposa, mas que obviamente tinha um fundo de verdade: ele estava trabalhando até altas horas da noite despachando e-mails em sua cama, em vez de fazer coisas mais interessantes.
É impressionante como os hábitos mudaram radicalmente nos últimos anos. Quem tinha, há 15 anos, e-mail, celular e Internet banda larga em casa? Hoje, não vivemos mais sem eles. Esta é a nova realidade. Um mundo onde temos a conveniência e as facilidades trazidas pelas novas tecnologias, mas que, além dos benefícios, trazem os problemas da perda de privacidade e da invasão da vida pessoal com os assuntos de trabalho.
Fonte: Adalton M. Ozaki – coordenador dos cursos de graduação em administração de empresas da FIAP. Atua há mais de 15 anos no setor de tecnologia de informação e atualmente é sócio-diretor da ADF Consulting.